Terceira e última parte do artigo dedicado ao ouro.
A primeira parte pode ser encontrada neste link, a segunda neste.
Boa leitura.
No centro da história das reservas de ouro há uma questão particularmente delicada: de quem são os
lingotes que são (eram?) guardados nos cofres dos bancos centrais e que, em seguida, foram entregues (alocação, leasing, Bancos Bullion, etc.)?
Obviamente, a resposta depende da propriedade dos bancos centrais.
É um aspecto importante: sabemos que muitos dos bancos centrais foram "privatizados" e a maioria dos delegados nos conselhos de administração não são emissários dos governos mas de bancos privados.
Temos a certeza de que, na transição de propriedade, foi calculado o valor dos activos representados pelas reservas de ouro? Na verdade, já é complicado conseguir documentos oficiais que testemunhem a "privatização", o discurso ouro é ainda mais obscuro.
De acordo com um documento do Banco Central Europeu acerca do tratamento das reservas internacionais, as directrizes não exigem uma diferenciação entre o ouro guardado nos cofres e o ouro alugado ou dado em leasing: o documento afirma que "as transacções reversíveis de ouro não têm nenhum efeito sobre a quantidade de ouro monetário, independentemente do tipo de operação (por exemplo, swaps de ouro, acordos de recompra, depósitos ou empréstimos), em linha com as recomendações contidas nos regulamentos do Fundo Monetário Internacional.
Dito de outra forma: mesmo que o ouro tenha saído dos cofres por causa de operações financeiras, os bancos centrais estão autorizados a continuar a considera-lo nos orçamentos deles como activos (desde que o metal seja suposto voltar, cedo ou tarde...).
Portanto, muito poucos bancos centrais esclarecem exactamente a percentagem das reservas oficiais de ouro armazenado fisicamente e qual a percentagem que, pelo contrário, aparece apenas nos orçamentos. E não admira: seria difícil manter a reputação dum Banco Central cujo ouro na verdade já saiu há um tempo dos cofres, com destinos um intermediário que vendeu o metal à China ou à Rússia.
No entanto, os dados sugerem, de acordo com o analista Valentin Katasonov, que foi exatamente isso o que aconteceu. É mais do que provável que o ouro dos Bancos Centrais tenha saído e que os mesmos bancos não têm agora a real possibilidade de voltar a comprá-lo, cúmplice o preço do metal amarelo que disparou nos últimos anos.
A fonte secreta
A hipótese é também apoiada por Erik Sprott, investidor bilionário com 35 anos de experiência nos mercados financeiros, com um grande conhecimento dos meandros do comércio aurífero.
Afirma Sprott:
Os dados oficiais não têm plenamente em conta a procura real de ouro no mercado mundial (estimada pelo World Gold Council entre 4.000 e 4.500 toneladas por ano). [...] A procura efectiva teria sido maior em 2.300 toneladas ao longo da última década e a oferta oficial, por meio de novas operações de mineração de ouro e reciclagem, não seria suficiente para atender à demanda no mundo.
Mesmo assim, a procura foi atendida. Portanto, houve uma fonte secreta de ouro que cobriu algumas necessidades não contabilizados: cerca de 2.300 toneladas por ano.
De acordo com Sprott:
O volume de ouro oficialmente oferecido no mercado pelos Bancos Centrais não é suficiente.
Desde o início do século XXI, fornecimentos adicionais foram realizados em segredo pelos Bancos Centrais e o Fundo Monetário Internacional.
Se as afirmações de Sprott estiverem correctas, as reservas de ouro dos bancos centrais das economias desenvolvidas foram disponibilizadas para atender a procura adicional:. e nada disso foi contabilizado nos documentos oficiais. E isso significa que os cofres daqueles bancos contêm hoje muito menos ouro do que o esperado.
Além disso, é preciso lembrar que os mesmos cofres já encontravam-se parcialmente esvaziados na década anterior. De acordo com as estimativas de Veneroso:
Já em 1998, quase metade das reservas oficiais de ouro de todos os bancos centrais encontravam-se fora dos cofres.
Neste caso, não apenas alguns banqueiros centrais teriam dado a sua "própria de ouro", mas também que guardava em nome de outras nações.
Neste caso, os bancos centrais de alguns Países não apenas venderam os seus próprios depósitos, como também o ouro guardado por conta de outros Países.
E começa a fazer sentido o pedido da Alemanha para o repatrio o ouro e o prazo útil de sete anos para a devolução. Berlim tem dois terços das próprias reservas (1.536 toneladas) localizados nos cofres da Federal Reserve Bank de New York; 374 toneladas nos cofres do Banco de França e 450 toneladas nos cofres do Banco da Inglaterra. Pelo menos, é aí que deveriam encontrar-se...
Os Grandes Armazéns
Quem guarda o ouro de quem? Os grandes "armazéns" e ouro são Estados Unidos, Grã-Bretanha, França e Suíça, também conhecidos como The Golden Billion Group.
De acordo com dados divulgados em Outubro de 2012, o ouro de propriedade dos EUA totaliza 8.133 toneladas e aquele guardado 6.200 toneladas.
O ouro do Reino Unido equivaleria a apenas 310 toneladas, uma quantidade insignificante em relação ao que Londres guarda: 5.067. toneladas.
Nas caves da Federal Reserve e do Banco da Inglaterra, portanto, deveriam ser guardadas mais de 11 mil toneladas de ouro estrangeiro. Note-se que só no Reino Unido, a quantidade de ouro estrangeiro é de 16 vezes maior do que o ouro nacional, enquanto nos Estados Unidos é apenas 76% das reservas americanas.
O Banco da Inglaterra guarda o ouro de vários Países da Commonwealth (Austrália, Canadá, Índia, etc.) e desempenha também um papel importante no caso dos Países da Europa continental: a Áustria, por exemplo, entregou-lhe 80% das suas reservas, a Holanda 18%, a Alemanha 13%. Há também outros "clientes": o Banco Central do México, por exemplo, entregou aos britânicos 95% de todo o seu ouro.
Hoje, no entanto, todo a estrutura é abalada:
- De acordo com uma recente pesquisa recente da OMFIF (Official Monetary and Financial Institutions Forum) a procura de ouro vai crescer, impulsionada pela necessidade de criar um novo sistema de reserva multimonetaria, onde a moeda chinesa vai tentar desempenhar um papel importante, para equilibrar a instabilidade do Dólar e do Euro.
- A procura chinesa de ouro está a aumentar rapidamente. A taxa de importação de ouro na China apresenta um crescimento é sem precedentes. A importação de ouro através de Hong Kong foi de 45 toneladas em 2009, 431 toneladas em 2011 e em 2012 ultrapassou as 834 toneladas. A China pretende continuar as compras nos mercados mundiais para atender às necessidades crescentes da indústria de jóias, a crescente demanda por investimentos e para constituir uma sua própria reserva aurífera.
- Após o começo da crise de 2008, alguns bancos começaram activamente a procurar ouro no mercado mundial.
- No início de 2013, o processo foi chamado de "febre amarela". A corrida ao ouro é um sinal de medo, algo que une os pequenos e grandes investidores que desconfiam do clima económico. Mais uma vez, o ouro qual bem-refúgio.
- Nos primeiros 11 meses de 2012, os bancos centrais de alguns Países emergentes colocaram no seus cofre 350 toneladas de ouro (segundo os dados do World Gold Council). Em primeiro lugar entre os compradores a Turquia (cerca de 80 toneladas), depois a Rússia (55 toneladas), as Filipinas (35 toneladas) e o Brasil logo atrás. As surpresas vêm do Cazaquistão e do Iraque que terminam em quinto e sexto lugar com trinta toneladas cada. México, Coreia do Sul, Paraguai e Ucrânia fecham o ranking.
- Foi reduzida para metade a oferta de ouro reciclado. Em média, durante a primeira década do século XXI, este tipo de fornecimento proporcionava 1.700 toneladas, hoje apenas 850 toneladas.
- Como vimos, alguns Países querem repatriar as suas reservas oficiais de ouro. Além da Alemanha e da Holanda, também Equador e Azerbaijão começaram os preparativos para o regresso do metal. Isso poderia resultar numa vaga de pânico se, como afirmado por algumas fontes, o ouro nos cofres dos Países "armazéns" já foi.
De acordo com o analista Valentin Katasonov:
O ouro poderia acabar a qualquer momento. Talvez já acabou. Um dos sinais é o facto de estar a tornar-se mais frequentes os escândalos relacionado com o metal, como no caso das barras de tungsténio.
As barras de tungsténio teriam substituídos as barras de ouro em Fort Knox. Neste sentido, existem várias investigações por parte de membros do Congresso dos EUA, incluindo a iniciativa gerada por Ron Paul na altura em que era Presidente da Comissão dos Assuntos Monetários.
Rod Kirby, no seu site The Market Oracle, afirma:
Cerca de 15 anos atrás, durante a administração Clinton, entre 1,3 milhão e 1,5 milhão de barras de 400 onças cada foram produzidas nos EUA. Posteriormente 640.000 dessas barras foram cobertas com ouro e enviadas para Fort Knox, onde ainda estão.
É supérfluo salientar que, se isso fosse verdade, estaríamos a enfrentar o maior embuste da história.
Mas nada que possa nós espantar.
Ipse dixit.
Relacionados:
Fontes:
O presente artigo é baseado em múltiplos trabalhos de vários autores e instituições, todas fontes regularmente citadas no texto e disponíveis na internet. Infelizmente perdi a página com todos os links, e peço desculpa por causa disso (deve ser a primeira vez em três anos de blog...).
Poderia procura-los? Poderia, mas sou preguiçoso, portanto deixo o trabalho à boa vontade do Leitor curioso. Além disso é Verão, o Leitor não trabalha, tem todo o tempo do mundo.
Como? No Brasil é Outono e acabaram as férias? E que culpa tenho eu se moram no hemisfério errado?
Para facilitar (porque sou incrivelmente bom), eis a lista das fontes:
- Marco Saba, director de pesquisa do Centro Estudos Monetários
- Katasonov Valentin, analista de Global Research
- James Turk, analista financeiro, autor de The Collapse of Dollar
- Frank Veneroso, analista, autor, membro do Gata, autor do relatório 1998 Gold Book Annual
- Peter Krauth, analista de Money Morning
- Steve Scacalossi, vice-presidente da TD Security
- Keith Barron, geólogo
- Erik Sprott, investidor
- Official Monetary and Financial Institutions Forum
- World Gold Council
- Rod Kirby, autor do site The Market Oracle
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